Política

Instrumentos do Estado maltratados por Bolsonaro

O presidente Jair Bolsonaro (PSL) maltrata instrumentos de Estado que atenderiam ao marketing de seu governo. A bem da verdade, ele não reinventa a roda de desmandos do poder. Porém, exagera quando seus coturnos assumem o papel da “bic” e rabiscam pensamentos no Twitter. O editorial “A batalha contra a realidade”, de hoje (27), no Estadão, em sumário, mostra isso. Fica evidente onde a inteligência do time de generais do IME e brigadeiros do ITA perde o jogo: no desprezo pelo poder da Comunicação.  

No início do primeiro Governo Lula (e antes de estourar o ‘Mensalão’), o jornalista Maurício Lara fez uma palestra no Sindicato dos Jornalistas de MG. Ele era da equipe de governo, na área de Ricardo Kotscho. Direto e debruçado em números, sintetizou o poder de manipulação (não usou essa palavra) à disposição do Governo país afora: “(mais de) 400 núcleos de jornalistas”. E outra legião de profissionais experientes em marketing e publicidade, dentro e fora das sombras do Planalto. O conjunto cobria cada m2 dos labirintos federais. Sempre de prontidão, até por mais que 24 horas do dia, se fosse possível esticar a contagem do tempo. E, por fora, havia o reforço dos serviços contratos e dos governos estaduais e municipais vinculados.

IBGE teve que mascarar realidade do Estado

O país estava ocupado por um verdadeiro Estado da Comunicação. Em tese, eram poucas chances para erros. Todos a serviço dos Ministérios, autarquias, estatais de capital misto (com ações do capital em Bolsa e sócios privados – nacionais e estrangeiros). A ordem permanente (decorada até nas vírgulas) era neutralizar notícias ruins (péssimas, mesmo). Portanto, tarefa fácil. Governo sempre tem centenas de inaugurações e “novos” programas, principalmente de alcance social. Se, mesmo assim, o gráfico da opinião pública despencasse, o Governo Lula pinçava, do fundo de alguma gaveta, um indicador positivo.

Assim, entravam em campo IBGE, Ipea, BC, Caixa... Mas, se, ainda, tudo parecesse perdido, era despachado um “Fato Relevante” de estatal, preferencialmente da Petrobras. No pregão da Bovespa, se requentava 50% do discurso para o empresariado. Felicidade maior girava nos borderôs do capital externo – especulativo. No final, o mais importante, serenava a população na proa do barco.

Lula mudou “pibinhos”; FHC curtiu o real

No final, Lula da Silva (PT) surfou ondas tenebrosas do Mensalão. O fundador do PT pegou mais um mandato. Além disso, sem esforço, fez Dilma sucessora e reeleita. Contudo, Dilma Rousseff, com toda aquela galera da Comunicação, não teve a malandragem do padrinho. Batia muito. Não era de afagos. Caiu, em maio 2016, embaçada na neblina de escândalos que aflorava no curso das investigações da Lava Jato, que já banca 13 meses da prisão de Lula. Mesmo sem ser investigada, ela perdeu, porque não soube sobreviver ao jogo no tombo das “pedaladas”.

Lula e Dilma também deram sovas nos instrumentos de Estado. Queriam deles maior engajamento às suas propagandas pessoais. Michel Temer, em seus dois anos e meio, também abusou. Porém, os três nunca se rebelaram contra todos, de uma só vez e permanentemente, como faz Bolsonaro. Eram sazonais. Ao IBGE e Ipea, por exemplo, impuseram várias “revisões” aos desconfortáveis “pibinhos”. Houve algumas intervenções políticas. Por várias vezes, decretaram giros de 180 graus em gráficos feios. Assim, índices negativos viravam positivos, ou nem tão sofríveis. Lula tanto mexeu que a economia de sua era teve “crescimento” (média anual de 4%) acima dos oito anos do antecessor Fernando Henrique (2,3%). FHC (PSDB), por sua vez, montado na estabilidade da moeda, principal âncora do Plano Real, e privatizações, inaugurou segundo mandato.

Nairo Alméri

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