A manobra adotada no governo Zema para forçar a adesão de Minas ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF) pode ser derrubada no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF). Por meio de sua Advocacia Geral do Estado (AGE), o governo Zema atropelou a Assembleia Legislativa para alcançar seu objetivo de forma judicial, ainda que precária e liminar.
Por lei, a aprovação depende de autorização legislativa da Assembleia de Minas, mas Zema recorreu ao Judiciário, alegando omissão da direção do Parlamento. No dia 1º de julho passado, às vésperas do início da atual campanha eleitoral, o ministro Nunes Marques (STF) atendeu ao pedido de Zema sem sequer ouvir o Legislativo mineiro. Ao autorizar a adesão ao RRF, Nunes Marques também atropelou o direito de defesa e classificou a Assembleia de omissa com base no que lhe apresentou a AGE. A decisão deverá ser confirmada ou não pelo plenário de 11 ministros da Suprema Corte em julgamento ainda não pautado.
“O ministro (Nunes Marques) deve ter sido mal informado sobre isso e tomou uma decisão que fala de omissão, algo que jamais aconteceu. Portanto, o que a Advocacia-Geral do Estado fez foi levar o ministro ao erro, ao colocar em suas peças endereçadas ao Supremo que a Assembleia de Minas não votava. A Assembleia votou e fez a sua opção, e o governador concordou com ela. Caso não concordasse teria vetado o artigo 23”, observou o presidente do Legislativo mineiro, deputado Agostinho Patrus (PSD). Ele referia-se ao artigo do projeto aprovado pelos deputados, em maio passado, que autorizou o Estado a refinanciar parte da dívida junto à União.
Na primeira vez que falou sobre o episódio, o parlamentar ainda elevou o tom, chamando o governo Zema de “mentiroso” e “irresponsável”. “Toda vez que alguém falar que a Assembleia foi omissa, vai estar em cima da cabeça dele: ‘é um mentiroso’”, reagiu ele em crítica direta a Zema e indireta ao ministro. A parte do “irresponsável” ficou por conta do desinteresse com o qual Zema conduziu a negociação de compensação ao Estado por conta da Lei Kandir. Essa lei federal isenta, há 26 anos, produtos de exportação do pagamento do ICMS, principal fonte de receita estadual.
Após pressões, em 2020, foi assinado acordo entre governo de Zema e a União sobre repasses dessa lei. No acordo, ficou estabelecido que Minas receberá só R$ 8,7 bilhões em até 17 anos. Segundo estimativas da Secretaria de Estado de Fazenda, Minas deveria receber R$ 135 bilhões. O acordo pífio afeta ainda mais as finanças de Minas.
“Quem foi o irresponsável que assina uma dívida transitado e julgado, depois se 12 a 0 no Supremo e faz um acordo em cima R$ 135 bilhões para que Minas receba R$ 8 bilhões? Será que o omisso é quem assina R$ 8 bi e não R$ 135 bi, ou quem aprova o artigo 23 que é previsto na lei? “, questionou Agostinho Patrus.
Com o apoio de 25 entidades associativas, o presidente da Assembleia Legislativa foi incentivado a adotar medidas judiciais para reverter a adesão de Minas ao RRF no Supremo. “Aderir ao RRF significa admitir grave ofensa ao pacto federativo, curvar-se à supremacia de interesse financeiros e comprometer o futuro do Estado e da sociedade mineira”. Esse foi o tom do documento entregue ao parlamentar, durante reunião com dirigentes sindicais, no dia 17 de agosto, na Assembleia.
O ofício é assinado por 25 lideranças do funcionalismo público mineiro, representantes do Judiciário, da educação, da saúde, do Ministério Público, da magistratura e das forças de segurança. Durante a reunião, os sindicalistas manifestaram apoio ao Legislativo mineiro pela condução da proposta de adesão ao RRF, pela abertura e diálogo com a sociedade civil, e criticaram a postura do Executivo.
As entidades signatárias do documento também avaliam como equivocada a decisão do STF sobre o RFF sem autorização legislativa. Ou seja, sem a aprovação do Projeto de Lei (PL) 1202/19, que trata da autorização legal para ingresso no regime.
O presidente da Assembleia citou que a lei federal que trata do RRF dá aos estados duas alternativas: aderir ao regime ou votar o artigo 23, que renegocia a dívida, para que seja paga mês a mês. Agostinho Patrus enfatizou que a Assembleia fez a sua opção votando o artigo 23 e que, ao sancioná-lo, o governador mostrou sua anuência.
A coordenadora-geral do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação (SindUte), Denise de Paula Romano, também considerou que o governo mineiro “induziu o STF ao erro”.
Porém, como a sentença de Nunes Marques ainda será apreciada pelo Pleno do STF, a sindicalista acredita que a decisão monocrática “não se sustenta”. A expectativa das entidades é conseguir modificá-la por conta das ações adotadas no Legislativo e que foram omitidas.
“O governo de Minas atropelou a Assembleia Legislativa, fez uma confusão de poderes e disse na peça que não houve uma discussão e que a ALMG se omitiu. Nós do sindicatos fizemos a luta política, nós fizemos a greve, as manifestações. Quem não quis negociar foi o governo de Minas, assim como não negociou sobre o reajuste dos servidores. O governo sempre recorre ao judiciário por não ter competência para dialogar”, pontuou Denise.
Para Sara Felix, da Associação dos Funcionários Fiscais (Affemg), o regime de recuperação fiscal vai transformar Minas em anexo do governo federal, que passaria a ter o comando administrativo do Estado que adere ao RRF. Edson Mateus (SindifiscoMG) citou exemplo do Rio de Janeiro, estado que aderiu e que, por isso, teve dificuldades para contratar médicos durante a pandemia.
Aliados do governador reclamaram do encontro, questionando a participação de algumas entidades. Em entrevista, no interior mineiro, Zema disse, no dia 17, que sua relação com os deputados estaduais durante o mandato foi prejudicada pelo “projeto de poder pessoal”.
“Tudo que ele (Agostinho Patrus) podia fazer para que projetos importantes para Minas Gerais não fossem analisados, vou falar nem votado, porque não deixou nem os deputados analisarem. Entre eles, o Regime de Recuperação Fiscal, que nós enviamos há três anos. Ele sequer colocou isso para os deputados analisarem, darem sugestões. Ele simplesmente deixou dentro da gaveta”, afirmou Zema.
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