Na época em que foi ministro da Indústria, Comércio e Turismo do Governo Figueiredo (1979-85), o engenheiro mineiro João Camilo Penna era crítico a certas posturas do Estado. “É ágil para criar coisas erradas. E lento para sair delas”. Essa uma de suas frases. Camilo Penna não ficou toda gestão de Figueiredo. Foi derrubado (agosto de 1984) por Antônio Delfim Neto, então, ministro do Planejamento.
“A Coreia do Sul vem aí (com uma indústria) certinha, e muita qualidade no ensino, mostrando como se faz um tigre asiático (referência às economias emergentes da Ásia)”, alertava Camilo Penna.
Ele reprovava, igualmente, a postura do Governo de bancar quase tudo nos empreendimentos privados. Dentro dessa filosofia, impediu que o Conselho de Desenvolvimento Industrial (CDI) aprovasse liberação de mais recursos ao megaprojeto da Transit Semicondutores, em Montes Claros (MG). A empresa era de um ex-presidente do Banco de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (BDMG), Hindemburgo Chateaubriand Pereira Diniz.
Sem o aval de Camilo Penna, portanto, não houve mais “dinheiro novo” do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE – ainda não tinha o Social) para a Transit. O projeto já tinha queimado recursos do BDMG, BNDE e linhas institucionais da área Mineira da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). Por fim, faliu. Camilo Penna ainda era ministro.
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Verba pública para ADIMB
Mas, a cultura de sempre gastar preferencialmente o recurso do Tesouro Nacional sobrevive no “espírito empreendedor” (jargão tecnocrata) do empresário brasileiro. E, sendo assim, o Governo Bolsonaro bancará, novamente, a montagem do Pavilhão Brasileiro na PDAC 2020 – International Convention Trade Show & Investors Exchange (Convenção Mundial de Mineração e Exploração Mineral). Será de 1º a 4 de março, em Toronto, no Canadá. O gasto não é milionário, portanto, facilmente suportável pelo empresariado interessado do setor mineral. Contudo, faz falta à saúde, ensino, segurança e outros serviços públicos básicos.
O desembolso, de R$ 250 mil, para o espaço brasileiro, sairá pelo caixa da estatal Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM/SGB). Mas, na prática, a CPRM não existe mais, pois, foi engolida pelo Serviço Brasileiro Geológico (SGB). Este, porém, manteve a sigla – convivência jurídica confusa. O dinheiro, liberado em Processo de Inexigibilidade de Licitação Pública (PDL nº 0250/2019, de 26/12/2019), será gasto pela Agência para o Desenvolvimento Tecnológico da Indústria Mineral Brasileira (ADIMB).
… que se diz “autônoma financeiramente”
Ao ser criada, em 9 de junho de 1996, a ADIMB se cercou dos poderosos da mineração no país. Eram empresas estatais e privadas, e entidades privadas e órgãos públicos como: Ibram, DNPM, Docegeo, Caraíba, CBPM, Metamet, RTZ, BHP, Sopemi, CPRM, CVRS, Inco, Placer Dome, GEOS, Codemin, Geomag, Metago, Comig (atual Codemge), BDMG, Jaakko Poyry e Seicom. Na sua página eletrônica, a pompa: “A Agência para o Desenvolvimento Tecnológico da Indústria Mineral Brasileira – ADIMB, criada em 1996 é uma entidade privada, sem fins lucrativos, com autonomia administrativa, técnica e financeira” (sic). Pois bem!
Não há associado pobre na ADIMB
Perguntar não ofende: Não seria, então, o caso da ADIMB, por seus associados, bancar o Pavilhão e outros gastos mais? O Governo não tem mais estatais de produção mineral relevante, exceto para o petróleo e urânio – Petrobras e as Indústrias Nucleares do Brasil (INB) -, que passam longe do foco da PDAC. Além disso, está privatizando, em Editais, direitos minerários da CPRM/SGB.
Os associados da ADIMB estão distribuídos em três categorias:
- Natos – Ministérios de Minas e Energia e o da Ciência e Tecnologia e Agência Nacional de Mineração – ANM;
- Sênior – AngloAmerican, AngloGoldAshant, Bamin, Bemisa, Codelco, CBPM, Codemge, Freeport, Geosol, Lasa, Lundin, Nexa, Rio Tinto, SGS-Geosol, Vale e Yamana;
- Júnior – ALS, Arotec, Avanco Resources, Brasil Desenvolvimentos Minerais, Centaurus, CPRM/SGB, Core Case, Crusader, FFA Legal, Geosoft Latinoamerica, Iamgold, Invision, ITAK, Jazida.com, Kinross, Major Drilling, Omex Comércio e Exportação de Metais Preciosos, Potássio do Brasil, RBM, Rhio’s, Rio Grande Mineração, Serabi, Spatial Dimension, Sumitomo Metal Mining, Terra Goyana, Terrativa e Tristar.
Patrocinadoras bilionárias da PDAC
Iniciadas em 1932, as edições da PDAC têm relevância para mineração mundial. Organizadores anunciam 1.100 expositores, 2.500 investidores e 25.800 participantes de 132 países. Estarão as companhias mais ricas da mineração global, entre elas, a multinacional brasileira Vale S.A. Todas, então, sem restrição orçamentária para marcar presença na PDAC 2020.
A PDAC 2020, além do suporte financeiro de países (Brasil, Canadá e Peru), terá grupos economicamente sólidos como patrocinadores. Figuram nesse rol, portanto, marcas conhecidas: BHP, Nexa, BMO, CAT, RioTinto, Vale, TMX, Lind, Wheaton, Newmont, AngloAmerican, Franco Nevada, Major Drillind, B2Gold, Barrick, Iamgold, Pan American, Agnico Eagle, SNC Lavalin, CIBC, Lundin Group, Napier-Reid, BDO, Endeavour, Freepor-McMoRan, Hard-Line, Hudbay, Mosaic, Oceana Gold, PearTree, RPA, The Great Trail, RCB Capital Markets, Scotiabank, Micon, PeterBojtos, IBK Capital Corp e Sprott.
Turismo de tecnocratas; “S” e STF
Nessas despesas (diretas e indiretas) do Governo com missões e eventos no exterior há muito turismo de tecnocratas, sem resultados para o país. Se não fugir à regra, se repetirá em Toronto, em março. É assim com missões da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex), Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), entidades do Sistema S etc.
O Tribunal de Contas da União (TCU) tentou, no Governo Lula, mexer com isso. Todavia, esbarrou nos principais “S” loteados pelo Partido dos Trabalhadores (PT). Em outro viés, deu de cara com vespeiro dentro do Supremo Tribunal Federal (STF). Antes, no Governo FHC, uma investida do TCU pegou ministros do Supremo com esposas em rotas pelo Egito, quando as despesas (sem as esposas) se limitavam à Europa Ocidental. Nos Governos Dilma e Temer, continuaram as mesmas práticas.
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