O BNDES não quer perder mais tempo com a Unitec Semicondutores, de Ribeirão das Neves. O banco é acionista-investidor, tendo aportado 33,02% do cerca de R$ 1 bilhão aplicados na sociedade. A empresa, porém, não superou os estágios da construção civil, montagem de equipamentos (muitos deles usados) e comissionamentos etc. Nem todos os equipamentos foram instalados.
Em agosto, precisava de mais US$ 80 milhões, para montar a parte fundamental da fabrica de chips. Mas, por falta de garantias, há três anos nem os acionistas-investidores estatais (o outro é o BDMG) nem a Finep colocam dinheiro.
O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) decidiu, então, buscar proteção ao empréstimo feito e não pago, ingressando na Justiça com pedido de execução judicial. E obteve. Porém, na semana passada, a Unitec conseguiu embargar a execução (veja abaixo), que envolvia expropriação de equipamentos.
Duas AGEs traçaram mesmo destino
A última tentativa de uma tábua de salvação para a Unitec foi em 29 de agosto, em reunião no BDMG (Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais). Teve participação de representante da Finep (Financiadora de Pesquisa e Inovação/Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicação).
Aquela rodada ocorreu após duas convocações frustradas de AGEs dos acionistas (12 e 28 de agosto). Em ambas, a ordem do dia previa a desde a venda dos equipamentos à extinção da fábrica. O extremo seria na hipótese de os acionistas não aprovarem aportes de capital nem identificado outro investidor. Todas as partes silenciaram sobre a tal AGE e a reunião no BDMG.
BNDES tornou reunião inútil
Mas, fato é que, em 22/08 (bem antes da reunião no BDMG), já estava publicado despacho da juíza Andrea de Araújo Peixoto, da 26ª Vara Federal, do TRF-RJ, autorizando o BNDES a executar extrajudicial a dívida Unitec. Contudo, deixava brecha para, em até 15 dias, independentemente de penhora, para executada impetrar ação de embargo.
Na sentença do processo (Nº 5047703-03.2019.4.02.5101/RJ), que não revela o montante em atraso, a juíza fixou prazo de três dias para liquidação da dívida. Foi determinado ao Oficial de Justiça que se certificasse da “existência de bens passíveis de penhora”.
A magistrada quis, ainda, que a União Federal fosse intimada, para manifestar “interesse em intervir no processo”. Mesmo protocolo estendeu ao BDMG e à Finep. E, por último, autorizava o banco a inscrever a empresa de Ribeirão das Neves nos cadastros e inadimplentes.
Portanto, a reunião na sede do BDMG foi cena “para inglês ver” – faz de conta. Isso estava claro, diante das reações dos agentes do MCTIC e Finep, quando questionados por ALÉM DO FATO em evento matinal, na Fapemig, que antecedeu ao encontro no banco (relembre abaixo, no link “Finep, pouco otimista, tratou Unitec em reunião fechada”).
Expropriação causaria perdas de US$ 100 mi
Contudo, no último dia 04/11 (quarta-feira), a mesma juíza concedeu à Unitec “embargo à execução” (Ação de Busca e Apreensão em Alienação Fiduciária Nº 5075658-09.2019.4.02.5101/RJ), “com atribuição de efeito suspensivo”. Assim, a partir da publicação (06/11), foi suspensa a execução “até decisão final acerca da matéria debatida nestes autos”.
Nas justificativas pelo embargo, o advogado da Unitec, André Santos de Rosa, argumentou que a unidade fabril é “ultramoderna” e que emprega, na fabricação de chips, “tecnologia de ponta e equipamentos desenvolvidos exclusivamente para o exercício desta atividade”. Por conseguinte, a execução da sentença, com expropriação dos equipamentos e outros bens oferecidos em garantia aos empréstimos injetados por acionistas, “acarretará perdas irreparáveis”.
A Unitec ponderou, ainda, que “todo o ativo da companhia (se expropriado) não poderá ser sequer comercializado para as nações do hemisfério-sul, por total incapacidade de utilização”. E pontuou que “basta a inutilização/violação da ‘sala limpa’ – local onde estão instalados parte dos equipamentos para fabricação dos chips – para que milhões de reais sejam literalmente ‘jogados no lixo”.
O argumento mais contundente da empresa foi de que o ambiente da “sala limpa” precisa ser rigorosamente controlado – “pressão interna positiva, umidade e temperatura constantes, para se manter utilizáveis os equipamentos ali instalados”. Uma “despressurização” local determinaria o “sucateamento” dos equipamentos. A violação da área representaria prejuízo de US$100 milhões em equipamentos.
Juíza estaria desinformada
A juíza, além de acolher os argumentos da Unitec, considerou que a empresa ofereceu como garantia a hipoteca do imóvel. Assim, a empresa obteve deferimento ao embargo da Ação de Busca e Apreensão em Alienação Fiduciária Nº 5054344-07.2019.04.02.510.
Mas uma fonte que conhece com exatidão o segmento de semicondutores, no país e exterior, ponderou ao ALÉM DO FATO o seguinte: os equipamentos instalados na Unitec são usados, ou seja, “foram retirados de alguma ‘sala limpa’ em outro lugar do planeta”.
“Na verdade, sala limpa, hoje, não passa de um depósito relativamente limpo… E tudo nesse mundo pode ser mudado de um lugar para outro, basta que se tome as precauções certas”, acrescentou a fonte. E avaliou, portanto, que a juíza estaria pouco informada e confiando “unilateralmente no que eles dizem”.
Dança dos nomes ao sabor das trocas
A Unitec surgiu como Companhia Brasileira de Semicondutores (CBS), em 2005. Eram donos a Tecnologia Infinita WS-In Tecs Ltda, de Wolfgang Sauer (ex-presidente Volkswagen, no Brasil) e de Frederico Blumenschein (atual presidente da Unitec).
Em 2012, o empresário Eike Batista (Grupo EBX), entrou no negócio, e muda o nome para Six Semicondutores.
Com Eike quebrado, em 2014, a Corporación América, da Argentina, assumiu seu lugar – 33% do projeto. Com os argentinos, outro nome: Unitec.
BNDES colocou R$ 240 milhões
Em valores atualizados até o começo de julho, tinham apropriados na Unitec o equivalente a US$ 260 milhões. O projeto era criar a planta Nº 1 em semicondutores do Hemisfério Sul. Estaria voltada para produção de semicondutores nos nichos da IoT (internet das coisas), cidades e etiquetas inteligentes, cartões industriais e ciências da vida. Sua presença no mercado criaria 300 empregos qualificados.
Além do BNDES, BDMG e da Corporación América, são acionistas no projeto a IBM, Matec (empreiteira – capitalizou com a execução das obras civis) e a WS In Tecs.
Em 2012, no protocolo com o Governo de Minas, EBX e IBM Corporation se comprometeram com aportes de R$ 245 milhões cada. Naquele ano, Eike foi escolhido o Industrial do Ano pela Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg).
Pelas últimas estimativas, o BNDES injetou R$ 240 milhões (valor histórico) A BNDESPar (braço do banco federal) registra que detinha, em fevereiro e outubro, a participação de 33,02%. O BDMG aplicou R$ 56,2 milhões (dezembro 2018 – Relatório de Gestão e Socioambiental 2015-2018). Do início de 2017 para cá, Finep não liberou mais recursos.
Os US$ 80 milhões necessários, agora, a Unitec desejava que saíssem do orçamento Finep.
Minas, de forma coletiva, ignorou Unitec
Durante toda essa via crucis da Unitec, não há registro de defesa pública do projeto nem do setor público nem entre entidades do empresariado. Silenciaram o Governo de Minas (acionista), a Assembleia Legislativa (que fiscaliza o Executivo) e a Fiemg.
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