O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, foi autêntico em sua participação na abertura da Cúpula do Clima, na manhã desta quinta (22/04): vazio de propostas. Portanto, sem surpresas. Só ele acreditava que seria possível passar recebido de trouxas às principais lideranças políticas do planeta. A reunião, de forma virtual, marcou o Dia da Terra e continuará hoje. O encontro foi convocado pelo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e apresentou uma União Europeia coesa.
Ficou feio para Bolsonaro. Seu discurso não teve linha de conteúdo com os colegas nos propósitos de redução na emissão de gases de efeito estufa (GEE), até 2030, em 50%, e extinção, em 2050.
No geral, até mesmo governos de países de menor exposição geoeconômica, na política global, traçaram metas convincentes para o futuro. Os grandes, Estados Unidos e os do bloco da União Europeia, por exemplo, assumiram metas até novos desafios para 2030. Elevaram compromissos de ajuda financeira aos periféricos em prazos mais curtos. Os países europeus, desde a véspera, tinham assumido posição em bloco.
Bolsonaro pede ao mundo que, de forma ingênua, entregue, de imediato, US$ 1 bilhão a ele e seu ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles (ver mais adiante).
Bangladesh aplica 2,5% do PIB
Bangladesh, mais pobre que o Brasil, não estendeu o pires como condicionante. Pediu, sim, que países desenvolvidos contribuam financeiramente com nações em desenvolvimento e pobres. Mas, nem por isso, deixou de mostrar o que faz. A primeira-ministra de Bangladesh, Sheikh Hasina, informou em seu país políticas pelo clima recebem US$ 5 bilhões ao ano. Ou seja, 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB).
Mas, se o Brasil desejasse, num esforço dos Três Poderes, poderia encontrar recursos públicos internos. Teria, por exemplo, o US$ 1 bilhão que pede ao mundo, se retirar 15% das emendas parlamentares. No orçamento (colcha de bondades entre políticos) em votação, R$ 37 bilhões irão para as farras dos palanques de deputados e senadores.
Biden teve mesmo compromisso?
O presidente Biden saiu do estúdio antes de Bolsonaro começar sua fala. Foi cumprir agenda de reunião com assessores. Não perdeu nada. Mas, ficou no ar a pergunta: não teria sido efeito da carta dos governadores? Afinal, Bolsonaro poderá, se for candidato, não se reeleger em 2022. Isso, a exemplo do seu ídolo Donald Trump, derrotado por Biden, há seis meses. O atual chefe de Estado norte-americano, portanto, tem quatro anos pela frente.
A cúpula climática, que seguirá amanhã, completando participação de 40 chefes de Estado e Governo. Biden, em gesto marcante, retornou com os EUA ao Acordo de Paris, desfazendo atitude de Trump, assim que assumiu.
Bolsonaro mentiu sobre fiscalização
Bolsonaro esgotou seus minutos com estatísticas de governos passados. Quando olhou para sua administração, mentiu para o mundo (ao vivo). “(Que seu Governo implantou) fortalecimento de órgãos ambientais”. E jogou para o ibope dos apoiadores da cancela do Palácio Alvorada. Nesta parte, afirmou que está “duplicando os recursos (orçamentários) destinados à fiscalização (dos desmatamentos)”, e que, até 2030, seu Governo adotará medidas para o Brasil “diminuir o desmatamento ilegal (na Amazônia)”. Poderá até dobrar na previsão. Mas, a pergunta ao seu governo é de sempre a mesma, na questão ambiental: cumprirá?
Mas, Bolsonaro proporcionou momentos patéticos, ou de um candidato a “maluco beleza”.
Ele e seu ministro de Meio Ambiente permitem e facilitam a destruição da Amazônia. Todavia, na maior cara de pau, o chefe do Planalto fez defesa da importância da Floresta Amazônica na vida no planeta. E, por isso mesmo, se achou no direito de apresentar uma fatura, Nota Fiscal, de cobrança pelo oxigênio que passa nos pulmões da humanidade.
“…é preciso haver justa remuneração pelos serviços ambientais, prestado (s) por nosso bioma ao planeta, como forma de reconhecer o caráter econômico das atividades de conservação”.
O mundo, porém, quer ouvir de quem governa o Brasil, no momento, posição séria. Responsável. Não há tempo para discursos velhos descumpridos nem bravatas! “Precisamos ser mais rápidos”, alertou o presidente da Franca, Emmanuel Macron.
Perdeu chance de assumir culpas
Bolsonaro não apresentou um só compromisso. Certamente não agradou a ninguém entre os outros 26 líderes que falaram hoje. Faltou conteúdo, verdade. A lereia do Planalto não ofereceu liga para os mundos político e financeiro auditarem. Com agravante: tripudiou das lideranças ambientalistas do planeta. E deixou escapar a oportunidade de admitir os erros do seu Governo e de todos os demais no último meio século. Ou seja, não valorizou expectativas globais como, por exemplo, de um abandono, já, de sua política de destruição da Amazônia.
De qualquer forma, os EUA reagiram de forma educada. Departamento de Estado, então, avaliou que Bolsonaro fez um discurso “positivo”. Mas, não aplaudiu.
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Fernandes, da Argentina, bem melhor
Enquanto isso, seu colega da Argentina, Alberto Fernandes, foi claro em afirmar que “considera a (questão da) mudança climática como fundamental”. E foi enfático: seu governo adotará “medidas fortes para combater desmatamento. Consideramos desmatamento crime”. A Argentina, portanto, investirá na criação de uma cultura pró-clima: com leis de “proteção das florestas nativas”. Além disso, na “educação ambiental nas escolas”.
Indonésia cria “parque industrial verde”
Antes de Fernandes, o presidente da Indonésia, Joko Widodo, país também com enorme floresta tropical, assegurou que houve redução no desmatamento. Além disso, citou a recuperação de um pântano de 65 mil hectares, até 2024. E abordou desenvolvimento futuro relacionado às políticas climáticas.
A Indonésia construirá o maior “parque industrial verde” do planeta, com 25 mil hectares. O país tem metas de sustentabilidade para 2022, entre as quais, por exemplo, o impulso à montagem de carros elétricos, movidos a baterias elétricas.
Ministro vive ficção de US$ 133 bi
O ministro Salles, que pajeou Bolsonaro na fala ao mundo, convocou uma coletiva de imprensa. Mas, foi do tipo “passando a boiada” – expressão usada pelo ministro ao sugerir, em maio de 2020, Bolsonaro ir atropelando na Amazônia, enquanto a imprensa estava ocupada com a Covid-19. Tentou emplacar seu press release de vaidades. Relembre AQUI episódio “passando a boiada”.
Na tal coletiva, que foi pura perfumaria, o ministro do Meio Ambiente reprisou o que quis da sua farta literatura de inverdades e cinismo. E, com muita dificuldade na voz, usou duas ou três vezes a expressão “desmatamento ilegal” e “combate à ilegalidade” na Amazônia. Todavia, na verdade, deveria falar em desmatamento e incêndios criminosos. Os jornalistas convidados, deixaram “passar a boiada”.
Para Amazônia ou palanque 2022?
Salles, porém, viajou em maionese rançosa. Uma, por exemplo, a de que voa pelo mundo um papagaio de US$ 133 bilhões para cair na sua pasta e a mesa do chefe. A grana seria por conta de “neutralização de carbono” e outros adereços. Mas, sempre coisa do passado: seriam por conta de uma redução de 7,8 bilhões de toneladas. Todavia, esse hipotético ganho teria sido por conta de redução de emissões no período 2006-2017.
O Fundo Amazônia tem R$ 3 bilhões em caixa. É gerido pela Alemanha e Noruega. Em função do desmantelamento pelo Governo Bolsonaro dos Conselhos da Amazônia, os dois países deixaram de liberar recursos. Não concordam que o governo tenha autonomia nos gastos.
Mas, o ministro Salles que, mesmo, é pôr a mão logo no tal US$ 1 bilhão. Com isso, disse em entrevista anterior, seu ministério reduziria o desmatamento na Amazônia em 30% a 40% em um ano. Faltou acrescentar: e deixar Bolsonaro melhor na foto para a campanha pela reeleição, em 2022.
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